Agostinho pressupôs como uma verdade bíblica que existe um só Deus que é Trindade, e que o Pai, o Filho e o Espírito Santo são simultaneamente distintos e coessenciais, numericamente um quanto à substância:
O Pai, o Filho e o Espírito Santo, isto é, a própria Trindade, una e suprema realidade, é a única Coisa a ser fruída [una quaedam summares], bem comum de todos. Se é que pode ser chamada Coisa e não, de preferência, a causa de todas as coisas — se também puder ser chamada causa. Não é fácil encontrar um nome que possa convir a
tanta grandeza e servir para denominar de maneira adequada a Trindade. A não ser que se diga que é um só Deus, de quem, por quem e para quem existem todas as coisas (Rm 11.36). Assim, o Pai, o Filho e o Espírito Santo são, cada um deles, Deus. E os três são um só Deus. Para si próprio, cada um deles é substância completa e, os três juntos,
uma só substância. O Pai não é o Filho, nem o Espírito Santo. O Filho não é o Pai, nem o Espírito Santo. E o Espírito Santo não é o Pai nem o Filho. O Pai é só Pai, o Filho unicamente Filho, e o Espírito Santo unicamente Espírito Santo. Os três possuem a mesma eternidade, a mesma imutabilidade, a mesma majestade, o mesmo poder. No Pai está a unidade, no Filho a igualdade e no Espírito Santo a harmonia entre a unidade e a igualdade. Esses três atributos todos são um só, por causa do Pai, todos são iguais por causa do Filho e todos são conexos por causa do Espírito Santo (A doutrina cristã, 1.5).
Em nenhum lugar Agostinho tentou demonstrar […] estas afirmações. “Trata-se de um dado da revelação que, para ele, as Escrituras proclamam quase a cada página, e que a ‘fé católica’ (fides catholica)¹ transmite aos fiéis”. Em seu entendimento, Deus é incompreensível, mas não incognoscível, havendo duas vias de conhecimento de Deus:
a via da eliminação, ou negação (apofática), que consiste em suprimir de Deus todos os defeitos das criaturas, e a eminência (catafática), que consiste em atribuir a Deus, elevando-as ao infinito, todas as perfeições: “Todo aquele que refletir sobre Deus desse modo, embora não chegue a conhecer plenamente o que ele é, contudo — enquanto pode — como homem piedoso, evitará pensar dele, o que ele não é”.
Pr. Franklin Ferreira. Revista Fé Para Hoje.
Agostinho e a santíssima trindade
¹A “fé católica” é a crença da Igreja Cristã primitiva, antes do surgimento do Catolicismo Romano.