Uma família de discípulos de Jesus
Sermões da IPB Rio Preto

Jesus nos guarda [Jo 17.6-19]

6 Manifestei o teu nome aos homens que me deste do mundo. Eram teus, tu mos confiaste, e eles têm guardado a tua palavra. 7 Agora, eles reconhecem que todas as coisas que me tens dado provêm de ti; 8 porque eu lhes tenho transmitido as palavras que me deste, e eles as receberam, e verdadeiramente conheceram que saí de ti, e creram que tu me enviaste. 9 É por eles que eu rogo; não rogo pelo mundo, mas por aqueles que me deste, porque são teus; 10 ora, todas as minhas coisas são tuas, e as tuas coisas são minhas; e, neles, eu sou glorificado.
11 Já não estou no mundo, mas eles continuam no mundo, ao passo que eu vou para junto de ti. Pai santo, guarda-os em teu nome, que me deste, para que eles sejam um, assim como nós. 12 Quando eu estava com eles, guardava-os no teu nome, que me deste, e protegi-os, e nenhum deles se perdeu, exceto o filho da perdição, para que se cumprisse a Escritura. 13 Mas, agora, vou para junto de ti e isto falo no mundo para que eles tenham o meu gozo completo em si mesmos.
14 Eu lhes tenho dado a tua palavra, e o mundo os odiou, porque eles não são do mundo, como também eu não sou. 15 Não peço que os tires do mundo, e sim que os guardes do mal. 16 Eles não são do mundo, como também eu não sou. 17 Santifica-os na verdade; a tua palavra é a verdade. 18 Assim como tu me enviaste ao mundo, também eu os enviei ao mundo. 19 E a favor deles eu me santifico a mim mesmo, para que eles também sejam santificados na verdade. João 17.6-19.

Sermão do Pastor Misael Batista do Nascimento. Pregado na Igreja Presbiteriana de São José do Rio Preto, no culto da noite de 05/10/2025, 19h.

Introdução

Neste culto em que alguns irmãos e irmãs receberão pela primeira vez a Ceia do Senhor como membros desta igreja, parece adequado meditar sobre o cuidado pastoral de Jesus por nós.

Jesus cuida de nós como “Bom Pastor” (Jo 10.11). Aqui, em João 17, Jesus ora por nós. Todo o trecho de João 17.1-26 é chamado de Oração Sacerdotal, apresentada a Deus Pai pelo Redentor quando reunido com os discípulos, por ocasião da Última Ceia.

O trecho que lemos contém a segunda parte desta oração. A doutrina central aqui é simples: Jesus cuida de nós. Por ele nós somos bem guardados, como consta no Hino “O bom pastor” (NC nº 151).

Ele guarda assim minha alma e a protege em seu calor.
Nas angústias ou na calma vai comigo o Bom Pastor.

Por que, para que e como Jesus nos guarda? Como é que Jesus segue conosco? Tais perguntas são respondidas quando tomamos pé de três verdades contidas no texto: [1] Jesus nos guarda porque pertencemos ao Pai (v. 6-10). [2] Jesus nos guarda para que sejamos unidos e alegres (v. 11-13). [3] Jesus nos guarda para que vençamos no mundo (v. 14-19).

É assim que prosseguiremos. Em primeiro lugar…

I. Jesus nos guarda porque pertencemos ao Pai

6 Manifestei o teu nome aos homens que me deste do mundo. Eram teus, tu mos confiaste, e eles têm guardado a tua palavra. 7 Agora, eles reconhecem que todas as coisas que me tens dado provêm de ti; 8 porque eu lhes tenho transmitido as palavras que me deste, e eles as receberam, e verdadeiramente conheceram que saí de ti, e creram que tu me enviaste. 9 É por eles que eu rogo; não rogo pelo mundo, mas por aqueles que me deste, porque são teus; 10 ora, todas as minhas coisas são tuas, e as tuas coisas são minhas; e, neles, eu sou glorificado.

Animais selvagens são mais facilmente abatidos por predadores porque não são guardados por um proprietário humano. Um rebanho de ovelhas é guardado porque tem dono. As ovelhas de Cristo são propriedade de Deus. É o que consta no v. 6, “eram teus, tu mos confiaste”, e ainda, no final do v. 9, “mas por aqueles que me deste, porque são teus”.

Isso é assim porque os discípulos acolhem a Palavra de Deus e Jesus como Deus Filho, enviado por Deus Pai (v. 6-8):

6 Manifestei o teu nome aos homens que me deste do mundo. Eram teus, tu mos confiaste, e eles têm guardado a tua palavra. 7 Agora, eles reconhecem que todas as coisas que me tens dado provêm de ti; 8 porque eu lhes tenho transmitido as palavras que me deste, e eles as receberam, e verdadeiramente conheceram que saí de ti, e creram que tu me enviaste.

Jesus afirma isso por causa da palavra dos discípulos, registrada em João 16.30: “Agora, vemos que sabes todas as coisas e não precisas de que alguém te pergunte; por isso, cremos que, de fato, vieste de Deus”. Alguns não acolheram Jesus. Os discípulos, porém, o receberam de bom grado, confirmando João 1.11-13. E este ato, de “receber” Jesus, traçou uma linha divisora entre os discípulos e o mundo (cf. v. 9): “É por eles que eu rogo; não rogo pelo mundo, mas por aqueles que me deste, porque são teus”. Os discípulos são “dados” por Deus Pai a Jesus (confirmando o Pacto da Redenção de Isaías 53.12). E pertencendo a Jesus, eles continuam pertencendo a Deus Pai (v. 10a): “ora, todas as minhas coisas são tuas, e as tuas coisas são minhas”. E pelo simples fato de serem alcançados pelo evangelho, os discípulos glorificam a Deus Filho (v. 10b): “e, neles, eu sou glorificado”.

Vejamos que o texto respondeu nossa primeira pergunta: por que Jesus nos guarda? Vimos que Jesus nos guarda porque pertencemos ao Pai. Agora tentemos obter uma resposta bíblica para a segunda pergunta: para que Jesus nos guarda?

De acordo com os v. 11-13…

II. Jesus nos guarda para que sejamos unidos e alegres

11 Já não estou no mundo, mas eles continuam no mundo, ao passo que eu vou para junto de ti. Pai santo, guarda-os em teu nome, que me deste, para que eles sejam um, assim como nós. 12 Quando eu estava com eles, guardava-os no teu nome, que me deste, e protegi-os, e nenhum deles se perdeu, exceto o filho da perdição, para que se cumprisse a Escritura. 13 Mas, agora, vou para junto de ti e isto falo no mundo para que eles tenham o meu gozo completo em si mesmos.

Jesus está voltando para o convívio glorioso do Pai, mas os discípulos permanecerão no mundo (v. 11a): “Já não estou no mundo, mas eles continuam no mundo, ao passo que eu vou para junto de ti”. Esta nova situação a ser enfrentada pelos discípulos exige que eles permaneçam unidos. Daí o pedido de Jesus, no final do v. 11: “Pai santo, guarda-os em teu nome, que me deste, para que eles sejam um, assim como nós”. Infere-se que esta unidade dos discípulos não decorre de engenho ou capacidade humana, mas sim é originada, sustentada e garantida pelo próprio Deus.

Até agora, Cristo é quem guardava os discípulos. No v. 12, Jesus informa que ele fez isso muito bem, de tal modo que o único que se perdeu foi Judas, a fim de se cumprisse a própria Palavra de Deus: “Quando eu estava com eles, guardava-os no teu nome, que me deste, e protegi-os, e nenhum deles se perdeu, exceto o filho da perdição, para que se cumprisse a Escritura”. Ou seja, enquanto no mundo, com os discípulos, Jesus os guardou unidos, sob seu seio. Agora que Jesus voltará para o Pai, é Deus Pai mesmo quem guardará os discípulos em unidade, em resposta à oração sacerdotal de Jesus Cristo. O restante do Novo Testamento (e.g., Ef 4.3) revelará que isso será garantido pela operação de Deus Espírito Santo.

Jesus faz este pedido diante de seus discípulos para que, quando ele partir, os discípulos recebam de Deus “alegria completa em si mesmos” (v. 13): “Mas, agora, vou para junto de ti e isto falo no mundo para que eles tenham o meu gozo completo em si mesmos”.

Até aqui, o texto responde a nossa segunda pergunta: para que Jesus nos guarda? Ele nos guarda para que sejamos unidos e alegres no mundo. Isso nos conduz à última questão: como Jesus nos guarda? De que modo Jesus, Bom Pastor, segue conosco?

O Evangelho revela, em terceiro lugar, que…

III. Jesus nos guarda para que vençamos no mundo

14 Eu lhes tenho dado a tua palavra, e o mundo os odiou, porque eles não são do mundo, como também eu não sou. 15 Não peço que os tires do mundo, e sim que os guardes do mal. 16 Eles não são do mundo, como também eu não sou. 17 Santifica-os na verdade; a tua palavra é a verdade. 18 Assim como tu me enviaste ao mundo, também eu os enviei ao mundo. 19 E a favor deles eu me santifico a mim mesmo, para que eles também sejam santificados na verdade.

Entendamos que Jesus não nos guarda da rejeição do mundo e sim na rejeição do mundo. Para esclarecer isso, é preciso olhar para a palavra “mundo” (kosmos), que aparece onze vezes na Bíblia versão Almeida Revista e Atualizada (e treze vezes no original grego, no fim dos v. 14 e 16). Fica bastante clara, especialmente no v. 14, uma acepção negativa da palavra “mundo”, como cultura oposta a Jesus e aos discípulos. O v. 14 informa que o Senhor Jesus deu sua palavra aos discípulos, mas o mundo odiou os discípulos, porque eles não pertencem ao mundo, assim como Jesus não pertence ao mundo.

É interessante que Jesus não recomenda a fuga do mundo. De fato, parece que não existe qualquer possibilidade de servir a Deus retirando-se ou escondendo-se do mundo. Pelo contrário, Jesus pede a Deus Pai, no v. 15: “não peço que os tires do mundo, e sim que os guardes do mal”. É por isso que afirmei que Jesus não nos guarda da rejeição do mundo. Enquanto neste mundo seremos rejeitados pelo mundo e enquanto rejeitados, seremos guardados por Deus neste mundo.

Mais uma vez, no v. 16, Jesus declara que isso é assim porque os discípulos não pertencem ao mundo: “Eles não são do mundo, como também eu não sou”. Além disso, Jesus nos guarda do poder do pecado, pois os pedidos que constam nos v. 17-19 relacionam-se com santificação, como segue: O meio estabelecido por Deus para nossa santificação é a Palavra de Deus — a Sagrada Escritura que contém a verdade: “Santifica-os na verdade; a tua palavra é a verdade” (v. 17). A santidade convém aos discípulos porque eles são enviados de Jesus ao mundo — a santidade convém à missão: “Assim como tu me enviaste ao mundo, também eu os enviei ao mundo” (v. 18). A santidade dos discípulos é garantida pela santidade do próprio Jesus, como lemos no v. 19: “E a favor deles eu me santifico a mim mesmo, para que eles também sejam santificados na verdade”.

Em suma, a oração sacerdotal de Jesus assegura aquilo que declaramos no Hino “Outra vez cantamos” (NC nº 398):

E do pecado, ó Pai, vem nos guardar
Ao virmos nós teu nome engrandecer.

Como Jesus nos guarda? Como é que Jesus, Bom Pastor, segue conosco? Ele nos guarda para que vençamos no mundo.

E se entendemos isso, podemos começar a concluir.

Conclusão

De acordo com João 17.6-19, Jesus nos guarda [1] porque pertencemos ao Pai, [2] para que sejamos unidos e alegres e [3] para que vençamos no mundo. Apesar dos pedidos de Jesus apontarem inicialmente para os Onze apóstolos eles também nos alcançam.

[Aplicação do ponto 1]. Jesus nos guarda porque pertencemos a Deus Pai. Nós pertencemos a Deus. Isso me faz lembrar da primeira linha da música “Graças” (CC nº 104) que gostamos de entoar: “Me tomaste em teus braços e me deste salvação”. Deus veio até nós; nos encontrou feios e pobres, sujos e fracos. Como afirma Paulo, em 1Coríntios 1.28, Deus nos achou “humildes e desprezados”. Deus nos enxergou. Decidiu nos amar. E nos tomou em seus braços. E da boca de Deus saíram as palavras: “Tu és meu”. Nisso se cumpriu, também em nós, a profecia de Oseias 1.10: “no lugar onde se lhes dizia: Vós não sois meu povo, se lhes dirá: Vós sois filhos do Deus vivo”. Nós temos Pai. Nós não estamos largados nesta vida e neste mundo. Nunca estamos sós, nem desguarnecidos.

Você entendeu o que isso significa, especialmente o que significa naquele contexto do primeiro século? Os discípulos, tomados de medo, podiam pensar e sentir que era “o fim da linha”. Que estavam sendo deixados sós. Que não haveria ninguém por eles. Que não existia qualquer base para esperança. E que o projeto ao qual tinham dedicado seus últimos três anos de vida podia ser identificado como “fracasso”. O fato é que, nos termos do evangelho, cada vez que chegamos a um ponto sem saída, há sempre um lugar para voltar chamado “Casa do Pai”. Isso é afirmado na famosa parábola do filho pródigo, em Lucas 15.11-32, e aqui, desde João 14.2. A “Casa do Pai” pertence ao Pai. E a “Casa do Pai” pertence ao Filho. A “Casa do Pai” pertence a todos os filhos do Pai, de tal modo, que não existem “moradores de rua” no reino do Pai. Sendo assim, como diziam os antigos, “tome prumo!”, ou, “tome tipo!”. Ou, como declarou o profeta Habacuque (em Hc 3.19): “O SENHOR Deus é a minha fortaleza, e faz os meus pés como os da corça, e me faz andar altaneiramente” ou “em lugares altos” (NVI) ou “o SENHOR Deus […] me faz andar nas minhas alturas” (NAA).

[Aplicação do ponto 2]. Jesus nos guarda para que sejamos unidos e alegres no mundo. Ora, se isso acha lugar em nossos corações, podemos andar neste mundo unidos e alegres.

Não apenas Jesus nos redime, de modo que Deus se torna nosso Pai. Ele nos insere na igreja como família. Igreja cheia de gente esquisita, maltrapilha, assim como nós e amada pelo Pai. Escolhida a dedo por ele. Coberta pelo sangue e pela justiça do Redentor. Uns cheiram de um jeito; outros, de outro. Uns penteiam cabelo de lado; outros nem sequer têm cabelo para pentear. Uns fazem a barba e outros só são barba. Uns são falantes e engraçados e outros, calados e soturnos. E sobre todos brilha a luz de Deus e em todos, o Deus vivo opera redenção. E todos comem do mesmo pão e bebem do mesmo cálice, que é Cristo. E nele todos são alimentados, ajuntados e alegrados.

Esta família — a família de Deus — é a melhor família do mundo, mesmo sendo composta pelos principais pecadores do mundo — como o próprio Paulo admitiu ser, em 1Timóteo 1.15. Família que às vezes irrita e decepciona. Família, às vezes, difícil de aguentar. Família que até dá vontade de abandonar. Mas entendamos isto, esta é a família que, nesta semana, socorreu uns aos outros com oração. Que está acompanhando, de diferentes modos, aqueles que se divorciam, e os que sofrem perdas, e os que têm necessidades materiais, e os doentes e os que chegam mancos e coxos. Com sua oração sacerdotal Jesus preserva esta família unida, ao mesmo tempo em que concede alegria, de modo que é aqui, em torno desta mesa, e unidos em Cristo, que desfrutamos de uma paz e uma felicidade que não pode ser roubada pelas circunstâncias. É sobre isso que nosso Senhor está falando, deste o cap. 14.

Nós entendemos isso? Ei, você. Você entendeu isso? Você não está sozinho, afetivamente falando, nem espiritualmente falando, nem socialmente falando. Jesus está orando por seus seguidores. Todo discípulo de Jesus tem um Pai no céu e uma família e alegria, na terra.

[Aplicação do ponto 3]. Jesus nos guarda na rejeição do mundo e do poder do pecado. Deste modo, firmados em Jesus, os discípulos podem prosseguir passando por toda decepção, por toda rejeição e transpondo as armadilhas do pecado. E mesmo que, por maldade ou descuido eles caírem na pior armadilha, para eles sempre haverá a Justiça e o Sangue do Redentor, disponíveis, acessíveis por graça. Restauração e perdão de Deus. Vida de Deus e alegria de Deus jorrando de Sião, fluindo da Cruz, revigorando forças, restabelecendo alegria e garantindo glória. Eu creio que foi constando isso que nossos irmãos do passado (C. Fry e J. Nelson) compuseram o Hino “Achei um bom amigo” (NC nº 113):

Que o mundo me abandone, persiga o tentador,
Meu Jesus me guarda até da vida ao fim.

Vamos orar sobre isso.