Uma família de discípulos de Jesus
Exposição de Marcos

24. Prioridades toscas de mentes inconversas [Mc 5.14-20]

Prioridades toscas de mentes inconversas

14 Os porqueiros fugiram e o anunciaram na cidade e pelos campos. Então, saiu o povo para ver o que sucedera. 15 Indo ter com Jesus, viram o endemoninhado, o que tivera a legião, assentado, vestido, em perfeito juízo; e temeram. 16 Os que haviam presenciado os fatos contaram-lhes o que acontecera ao endemoninhado e acerca dos porcos. 17 E entraram a rogar-lhe que se retirasse da terra deles.
18 Ao entrar Jesus no barco, suplicava-lhe o que fora endemoninhado que o deixasse estar com ele. 19 Jesus, porém, não lho permitiu, mas ordenou-lhe: Vai para tua casa, para os teus. Anuncia-lhes tudo o que o Senhor te fez e como teve compaixão de ti. 20 Então, ele foi e começou a proclamar em Decápolis tudo o que Jesus lhe fizera; e todos se admiravam. Marcos 5.14-20.

Pregado na IPB Rio Preto em 13/07/2014, às 19h30.

Introdução

Depois de algumas semanas de intervalo, finalizo a exposição de Marcos 5.1-20, destacando este trecho a partir do v.14. Este relato fecha o assunto introduzido em 3.22, como segue:

Marcos 3.20-30 Marcos 5.1-20
Jesus incompreendido e contestado Jesus incompreendido e contestado
Jesus instala o reino Jesus instala o reino
Escribas (influenciadores teológicos) de Jerusalém O “povo” (influenciadores comerciais) das proximidades
“Observar” e “avaliar” “Observar” e “avaliar”
Jesus é rejeitado Jesus é rejeitado

Ao mesmo tempo, o episódio ilustra a “semente que cai entre os espinhos”, da parábola do semeador, de Marcos 4.18-19.

Por isso o título deste sermão: Prioridades Toscas de Mentes Inconversas (o vocábulo “inconverso” significa não convertido). Ao serem confrontadas com a pessoa e a obra de Jesus, as pessoas desta região de Gerasa ou Gadara revelam o que é importante pra elas. Suas prioridades são toscas porque elas não são convertidas ao Senhor da Glória. Entendamos uma coisa: A conversão muda nossos sentimentos e vontade. Quando somos alcançados por Jesus, começamos a amar e desejar conforme Deus. Passamos a dizer como o salmista, “agrada-me fazer a tua vontade, ó Deus meu” (Sl 40.8). A conversão dá prosseguimento a uma comunhão com o Senhor que altera nossas disposições mais profundas (cf. o geraseno no v. 18). E não apenas isso. A conversão muda, também, o nosso modo de pensar. A gente reconsidera tudo. Isso produz uma alteração em nossa valorização das coisas. Algumas coisas que a gente valorizava são deixadas de lado. Coisas antes prioritárias deixam de sê-lo. Por outro lado, algumas coisas com as quais a gente não se importava agora são destacadas e altamente consideradas.

E tem mais: Marcos 5.1-20 demonstra que não apenas o homem endemoninhado era um escravo. Eu voltarei a este ponto na conclusão, mas devo dizer, neste momento, que as pessoas desta região de Gerasa ou Gadara também estão sob escravidão espiritual.

Retomando o título do sermão, as prioridades destas pessoas mencionadas em Marcos 5.14-17 são toscas, ou seja, “broncas” e “malfeitas”.[1] Mesmo diante da libertação do homem geraseno ou gadareno, este povo não se converte ao Senhor da Glória.

Que prioridades são essas? O que este povo de Gerada ou Gadara inverte ao ponto de não conseguir crer em Jesus?

I Primeira prioridade tosca: Informação ao invés de comunhão

14 Os porqueiros fugiram e o anunciaram na cidade e pelos campos. Então, saiu o povo para ver o que sucedera. 15 Indo ter com Jesus, viram o endemoninhado, o que tivera a legião, assentado, vestido, em perfeito juízo; e temeram. 16 Os que haviam presenciado os fatos contaram-lhes o que acontecera ao endemoninhado e acerca dos porcos. 17 E entraram a rogar-lhe que se retirasse da terra deles.

A primeira prioridade invertida destas pessoas de Gerasa ou Gadara é valorizar a informação sobre Jesus mais do que a comunhão com Jesus. Elas conversam umas com as outras acerca de Jesus (v. 14a, 16). Elas querem “ver” (v. 14b, 15). No v. 14b, a palavra grega traduzida como “ver” — eidon — é de uso bastante comum e não exige comentários, mas, no v. 15, o termo traduzido como “viram” é theōreō, de onde vem nossa palavra em português “teoria”. Isso quer dizer que elas analisam Jesus teoricamente, a fim de estabelecer um juízo sobre ele. Dito de outro modo, elas “veem” Jesus como um problema a ser resolvido, não como o Salvador a ser crido e obedecido.

Preste atenção nos detalhes do texto. Estas pessoas não perguntam diretamente a Jesus o que aconteceu — elas não ouvem dele o que ele fez, porque ele fez nem quem ele é. Elas o “observam” sem dispor-se a ouvi-lo. Elas o “olham” sem intenção de conhecerem-no como amado de suas almas. Elas estão espiritualmente desinteressadas. Elas não se aproximam de Jesus como Filho de Deus e Soberano Redentor, mas como “algo” ou “alguém” cujos atos precisam ser entendidos de uma perspectiva meramente humana e intelectual.

Resumindo, elas se achegam como curiosas e não como quem se interessa em ser crente e discípulo. Tanto é assim, que a única vez que elas falam algo a Jesus é para pedir que ele vá embora, como veremos adiante.

Você entende isso? A primeira prioridade tosca destas pessoas de Gerasa ou Gadara é que elas preferem informação sobre Jesus ao invés de comunhão com Jesus. Isso nos conduz ao segundo ponto…

II Segunda prioridade tosca: Conforto psicológico ao invés de interação transformadora

15 Indo ter com Jesus, viram o endemoninhado, o que tivera a legião, assentado, vestido, em perfeito juízo; e temeram.

A segunda prioridade bronca destas pessoas de Gerasa ou Gadara é preferir o conforto psicológico ao invés da interação transformadora com Jesus. O texto sugere que não apenas elas não conversam com Jesus acerca deste homem; elas também não conversam com o homem recém-liberto. Apenas o olham e “se assustam”. Uma paráfrase moderna diz que elas “ficaram impressionadas” (Bíblia A Mensagem), mas esta não é uma boa tradução. As melhores traduções são a ARA e ARC, “temeram”, NVI, “ficaram com medo” e NTLH, “ficaram espantadas” — o termo grego usado aqui, phobeō, é a base para nossa palavra em português “fobia”.

Estas pessoas de Gerasa ou Gadara têm medo de quê? O fato é que o confronto com Jesus revelou a profundidade do buraco no coração do geraseno ou gadareno (Mc 5.1-13). O confronto com Jesus nos coloca diante do “novo” e “inusitado”, ou seja, o que não é usual, que é “incomum” ou “estranho”. Para aquelas pessoas, o “normal” e receber notícias ou ver aquele homem geraseno ou gadareno nu, tresloucado, sujo, violento e repugnante. Agora elas o veem bem e percebem que forças espirituais incomuns operaram naquela vida. A exposição — por Jesus — do estrago interior do geraseno ou gadareno resultou em limpeza profunda e mudança de vida. Será que Jesus vai expor os meus demônios? Será aberto, nesta interação com Jesus, a pobreza e maldade de meu coração? Terei de apresentar diante de Jesus a mais esquisita treva que eu escondo no fundo do baú de minha consciência?

O coração enganoso nos leva a erigir fortalezas de conforto para nossos pecados. O sofá de nossa ruína espiritual é fofo. Nós passamos a gostar da escuridão de nosso quarto de entretenimento maligno. Vemos e ouvimos estas pessoas que se tornam cristãs dizerem que confessaram seus pecados, que abriram seus corações. Percebemos o quanto estas pessoas cristãs mudam de vida, mas, diante disso, ao invés de nos abrir a Jesus, nós nos fechamos, com medo. Invertemos as coisas e valorizamos mais o falso conforto do pecado do que a interação transformadora com Jesus. Ao fazer isso, reproduzimos a segunda prioridade tosca destas pessoas de Gerasa ou Gadara.

Dito isto, prossigamos para o terceiro ponto…

III Terceira prioridade tosca: Benefícios imediatos ao invés de benefícios eternos

17 E entraram a rogar-lhe que se retirasse da terra deles.

A terceira prioridade bronca destas pessoas de Gerasa ou Gadara é preferir benefícios imediatos ao invés de benefícios eternos. Comentaristas dedicados sugerem que o pedido do v. 17 é motivado, dentre outras coisas, por interesse econômico. Provavelmente, entre este “povo” estavam os proprietários dos porcos e Jesus causou prejuízo.

Como eu disse na introdução, Jesus leva os discípulos à região de Gerasa ou Gadara para exemplificar a “semente que cai entre os espinhos”, da parábola do semeador, de Marcos 4.18-19.

18 Os outros, os semeados entre os espinhos, são os que ouvem a palavra, 19 mas os cuidados do mundo, a fascinação da riqueza e as demais ambições, concorrendo, sufocam a palavra, ficando ela infrutífera (Mc 4.18-19).

A Palavra poderosa é semeada, mas outras coisas “concorrem” com a Palavra. A fé em Jesus é exclusiva. Jesus não aceita “concorrentes”. Esta é uma atualização de Êxodo 20.3: “Não terás outros deuses diante de mim”. Em lugar, Jesus esclarece e desafia:

Ninguém pode servir a dois senhores; porque ou há de aborrecer-se de um e amar ao outro, ou se devotará a um e desprezará ao outro. Não podeis servir a Deus e às riquezas (Mt 6.24).

O problema deste povo de Gerasa ou Gadara: Se a fé em Jesus implica em prejuízo financeiro, que saia Jesus.

Eis, então, três prioridades toscas. O povo de Gerasa ou Gadara prefere informar-se acerca de Jesus do que cultivar uma comunhão viva com Jesus. Eles preferem permanecer no conforto psicológico do pecado do que interagir com Jesus para serem transformados. E eles dizem sim aos ganhos financeiros imediatos e não a Jesus como Redentor e Benfeitos eterno. Conseguimos ver os problemas? Chegou a hora de concluir.

Concluindo…

Concluo com poucas afirmações. Primeira: Em minha opinião, os v. 14-17 são muito mais assustadores do que os v. 1-13! Nos primeiros treze versículos de Marcos 5, vemos a ação escancarada de Satanás como dragão destruidor.

Nos v. 14-17 enxergamos a ação sutil e muito mais perigosa de Satanás como Serpente Oculta na Grama Verde — enganadora e mortal, que hipnotiza e enfeitiça o ser humano fazendo-o achar que está tudo bem, quando na verdade, caminha para a destruição! Está tudo bem — ou pior, estava tudo melhor antes de Jesus. Nossa rotina estava ótima sem Jesus. Nossos negócios estavam ótimos sem Jesus. Jesus perturba e atrapalha. Abra os seus olhos espirituais. O endemoninhado dos v. 1-13 é perturbado pelos demônios, mas o povo, dos v. 14-17 é perturbado por Jesus! Você percebe como isso é assustador? Relembremos que o mesmo está acontecendo do outro lado do mar, com os religiosos judeus! Eles estão confortáveis com Satanás nas sinagogas e incomodados com Jesus! Isso é assustadoramente grotesco! Escravidão espiritual! O Evangelho de Marcos está nos mostrando seres humanos cujos corações estão subjugados por idolatria e tolice.

Segunda afirmação. Notemos o contraste entre v. 14-17 e v. 18-20. O homem outrora possesso por Legião — o “loucão” que assustava os cidadãos de bem; o lunático que batia na gente produtiva e trabalhadora de Gerasa ou Gadara — se torna um missionário. Para este recém-liberto, Jesus é mais precioso do que tudo! Jesus é sua principal prioridade. O povo respeitável de Gerasa e Gadara, porém, demonstra absoluto desprezo pelo homem recém-liberto (ninguém se congratula com ele!) e também por Jesus o Libertador. Para as pessoas daquela região, Jesus é menos importante do que os porcos. Prioridades toscas de mentes inconversas. A falta de conversão nos faz valorizar as coisas mais podres e inconvenientes, deixando de valorizar as coisas espirituais e importantes.

Terceira afirmação. Retornemos às ideias comuns de Marcos 5.1-20 e 3.20-30. Notemos os destaques deste Evangelho de Marcos. Admitamos que Jesus é contestado tanto por gente religiosa do judaísmo, quanto pelos pagãos ou gentios. Apesar de toda contestação, Jesus instala o reino de modo soberano e plenipotente. Pessoas estão sendo alcançadas por esta Palavra que “não volta vazia” (Is 55.10-13). Nem quando todo o inferno se levanta ou toda oposição humana se articula — nada detém o avanço do reino. É assim individualmente.

Talvez você erga defesas contra o evangelho de Jesus, declarando “daqui pra cá Jesus não entra”, mas Jesus continua instalando seu reino. Como diz este Evangelho, “O tempo está cumprido, e o reino de Deus está próximo; arrependei-vos e crede no evangelho” (Mc 1.15). Isso quer dizer que cada um de nós precisa dizer ao Redentor: “Senhor Jesus, seja o Rei da minha vida!”. Se você não fez isso ainda, precisa fazê-lo, porque este reino de Jesus não é apenas sobre as galáxias distantes, mas sobre o meu e o seu coração. Ele é o soberano que deseja reinar sobre nossas vidas.

Algumas pessoas deste Evangelho de Marcos interagem com Jesus de maneira crítica. Outras ser tornam suas seguidoras — seus discípulos. Chegou o tempo de parar de criticar e começar a crer. Este é o chamado do evangelho: Creiamos em Jesus, entregando a ele toda a nossa esperança e todo nosso destino.

Última observação: Que olhemos para este texto e não estejamos entre os que rejeitam Jesus Cristo. Esta é grande linha divisora do Evangelho de Marcos. Há os que o acolhem e os que o rejeitam. Que Deus nos abençoe e ajude a estar entre aqueles que acolhem a pessoa, a obra e esta doce comunhão com o Senhor da glória. Amém.

Notas

[1] FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Tosco. In: Dicionário Aurélio Eletrônico 7.0. Curitiba: Editora Positivo, 2009. CD-ROM.

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