Manhã de sábado, poucos minutos antes das 6h30. O despertador toca indicando que devo levar minha filha à escola. Na noite anterior terminou o Encontro da Fé Reformada e eu percebo que os pensamentos estão lerdos, o corpo responde mal aos comandos e até a fala está diferente. Sintomas de cansaço.
Confesso que já tive umas boas brigas com o cansaço. Até pouco tempo atrás, eu o detestava. Sem exageros, podiam me chamar de senhor cafeína ou reverendo coruja, pois eu almejava poder continuar sem dormir, noites seguidas, apenas para fazer tudo o que eu pretensamente “precisava”. Ou então, eu queria uma experiência semelhante à de Josué em batalha, dizendo algo como “Sol, detém-te em Gibeão, e tu, lua, no vale de Aijalom” (Josué 10.12). Assim eu prosseguiria altaneiro e insone, vencendo sobrenaturalmente os itens da agenda. Graças ao Senhor, como dizia minha mãe, “Deus não dá asas a cobras”. Hoje percebo o quanto estava errado, pois o cansaço é uma grande bênção.
O cansaço nos fala sobre nossa finitude. Ele indica, de modo simples, que não somos capazes de fazer tudo ao mesmo tempo. Além disso, sua presença pode indicar a necessidade de intervenções médicas ou mesmo alterações de hábitos. Ele é um alerta do estresse e nos força a parar, queiramos ou não. Enquanto o corpo, a mente e as emoções não receberem o suprimento de que precisam, ele – o antipático cansaço – continua incomodando, mostrando-nos de que estamos sendo teimosos e descuidados, maus mordomos do corpo criado por Deus.
O cansaço nos convida ao descanso, ao desfrute da completa e dadivosa inutilidade. O sentido bíblico da palavra sábado (descanso) é, literalmente, não fazer nada, não ser útil para nada, um espaço marcado na agenda para nada fazer, apenas ser. E ser em Deus, deixar-se acolher em seus braços, totalmente dependentes dele, afastados de angústias e preocupações, em autêntico exercício de humildade e fé.
É meu, somente meu, todo trabalho; e o teu trabalho é descansar em mim.
Bonito de cantar, difícil de viver. Principalmente para pessoas como eu, amantes das atividades, viciados em produtividade. Talvez seja aqui que o cansaço se mostra mais útil. Ele nos aponta a graça divina e nos ensina que tudo o que somos e temos, decorre do favor imerecido e não de nossos esforços imperfeitos: “aos seus amados ele o dá enquanto dormem” (Salmos 127.2).
Pastoral publicada no Boletim 92, de 02/10/2011. Rev. Misael.