Uma família de discípulos de Jesus
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Deus reina sobre os inimigos [Dt 2.16-23]

16 Sucedeu que, consumidos já todos os homens de guerra pela morte, do meio do povo, 17 o Senhor me falou, dizendo: 18 Hoje, passarás por Ar, pelos limites de Moabe, 19 e chegarás até defronte dos filhos de Amom; não os molestes e com eles não contendas, porque da terra dos filhos de Amom te não darei possessão, porquanto aos filhos de Ló a tenho dado por possessão.
20 (Também esta é considerada terra dos refains; dantes, habitavam nela refains, e os amonitas lhes chamavam zanzumins, 21 povo grande, numeroso e alto como os anaquins; o Senhor os destruiu diante dos amonitas; e estes, tendo-os desapossado, habitaram no lugar deles; 22 assim como fez com os filhos de Esaú que habitavam em Seir, de diante dos quais destruiu os horeus. Os filhos de Esaú, tendo-os desapossado, habitaram no lugar deles até este dia; 23 também os caftorins que saíram de Caftor destruíram os aveus, que habitavam em vilas até Gaza, e habitaram no lugar deles.) Deuteronômio 2.16-23.

Sermão do Pastor Misael Batista do Nascimento. Pregado na Igreja Presbiteriana de São José do Rio Preto, no culto da noite, em 09/11/2025.

Introdução

Nós somos convidados a prestar atenção em mais um trecho deste precioso sermão de Moisés, pregado para a nova geração de israelitas, pouco antes do povo cruzar o rio Jordão e entrar na Terra Prometida.

Moisés apresenta um resumo dos fatos históricos relevantes para aqueles ouvintes. É importante que a nova geração se lembre e compreenda taticamente [1] as instruções dadas por Deus, relativas ao povo de Amom — Deus instrui estrategicamente (v. 16-19). Além disso, é muito necessário que os israelitas não apenas se lembrem, mas também compreendam o modo de execução das [2] operações de Deus entre as nações — Deus intervém estrategicamente (v. 20-23).

O resultado disso deve ser o seguinte: Os crentes podem e devem viver cada dia e encarar cada luta certos de que o Deus fiel reina sobre os inimigos.

Olhando para o texto é isso que encontramos. Em primeiro lugar…

I. Deus instrui estrategicamente

16 Sucedeu que, consumidos já todos os homens de guerra pela morte, do meio do povo, 17 o Senhor me falou, dizendo: 18 Hoje, passarás por Ar, pelos limites de Moabe, 19 e chegarás até defronte dos filhos de Amom; não os molestes e com eles não contendas, porque da terra dos filhos de Amom te não darei possessão, porquanto aos filhos de Ló a tenho dado por possessão.

Esta é a terceira instrução sobre o trato com nações aparentadas com Abraão. Os edomitas são filhos de Esaú, neto de Abraão; os moabitas são filhos de Moabe e os amonitas são filhos de Amom, estes dois últimos filhos de Ló, portanto, sobrinhos-netos de Abraão. Deus tem acertos antigos com estes povos; Deus deu a eles suas respectivas terras (v. 4,5,9,19). Como temos dito, estas instruções sublinham a firmeza da palavra de Deus; a fidelidade de Deus a suas alianças e tratados.

Mas algo mais deve chamar nossa atenção que é o fato de Deus, por meio de comandos, conduzir seu povo estrategicamente. Há um propósito no coração de Deus e, por conta disso, há uma estratégia no coração de Deus. Vou repetir: Há uma estratégia no coração de Deus.

No âmbito militar, estratégia é o arranjo das coisas para vencer uma batalha.[1] No âmbito dos negócios, estratégia foca em realizar o necessário para o sucesso. A igreja até usa planejamento estratégico em seus planos missionários, mas lamentavelmente, pode ocorrer de eu e você investirmos pouco tempo e energia escutando a Deus a fim de compreendermos qual é a estratégia dele — a estratégia que está no coração de Deus —, relativa a esta batalha específica que estamos travando ou prestes a travar.

No caso destas instruções sobre os filhos de Esaú, Moabe e os filhos de Amom, Deus comanda dizendo “nãos” (v. 5,9,19). Em outras palavras, suas proibições são importantes. A geração incrédula, que foi “consumida pela morte” (v. 16), não prestou atenção na proibição divina e fracassou (cf. v. 1.42-46).

Resumindo, olhando para esta passagem de Deuteronômio, aprendemos que Deus nos instrui estrategicamente.

Em segundo lugar…

II. Deus intervém estrategicamente

É isso que Moisés informa neste longo parêntese (v. 20-23). Especialmente os v. 20-21a se parecem com o que vimos nos v. 10-12:

20 (Também esta [a terra de Amom] é considerada terra dos refains; dantes, habitavam nela refains, e os amonitas lhes chamavam zanzumins, 21a povo grande, numeroso e alto como os anaquins […].

Na mensagem da manhã eu expliquei que o termo “refains” designa uma raça de gigantes tida como sombrios (vinculados à morte) e quase divinos.[2] O povo de Moabe chamava esses refains de “emins” (v. 11), mas o povo de Amom os chamava de “zanzumins” (v. 20). Além de numerosos, eles eram grandes como os assustadores “anaquins” (v. 21; cf. Nm 13.28).

E eu entendo você que, talvez, se sinta um pouco confuso diante destes nomes. Mesmo assim, entenda que a mensagem de Moisés é clara: Deus arrasou esses gigantes a fim de dar a terra para os amonitas (v. 21b): “[…] o Senhor os destruiu diante dos amonitas; e estes, tendo-os desapossado, habitaram no lugar deles”.

Agora olhe para o v. 22 e perceba o padrão: Deus derrotou os horeus para dar a terra filhos de Esaú:

22 assim como fez com os filhos de Esaú que habitavam em Seir, de diante dos quais destruiu os horeus. Os filhos de Esaú, tendo-os desapossado, habitaram no lugar deles até este dia.

O v. 23 menciona uma conquista dos filisteus, aqui chamados de “caftorins” (considerando Caftor outro nome para Creta),[3] que destruíram “os aveus, que habitavam em vilas até Gaza”. A ideia que se repete aqui é: vejam que a terra pertence ao Senhor. Entendam que ele a distribui, removendo e instalando povos e nações, soberanamente.

Mas precisamos prestar atenção no modo como Deus faz isso em Deuteronômio. Pois o texto repete três verbos: “destruir”, “desapossar” e “habitar” (v. 21,22,23; cf. v. 12). Destruir (šmd) quer dizer “exterminar” (NVI). Desapossar (yrš) é “desapropriar”; “lançar fora” (ARC); “expulsar” (NAA). E o verbo “habitar” não carece de explicação.

É possível sugerir uma ordem de ações necessárias à conquista, qual seja: Primeiro destruir, depois desapossar, finalmente habitar. Eliminação seguida de limpeza de terreno seguida de instalação na terra conquistada. Nós voltaremos a este assunto em um próximo sermão, mas por ora é possível afirmar que esta ordem de ações nos ajuda a entender a Guerra Santa.

Outra coisa digna de verificar é que a escrita do texto, nos v. 21-22, informa Deus como aquele que destrói e os homens como aqueles que desapossam e habitam. Esta guerra é santa porque Deus mesmo luta nela. Os israelitas que ouvem Moisés devem compreender isso. Deus diz o que fazer e o que não fazer. O povo de Deus aguarda instruções e luta, avança ou recua conforme estas instruções.

Deus não apenas segue com o povo, mas luta em favor dele. E quando isso acontece, reis e gigantes não conseguem impedir o avanço de Deus.

Resumindo, olhando para esta passagem de Deuteronômio, aprendemos que Deus intervém estrategicamente.

Dito isto, comecemos a concluir…

Conclusão

Reafirmamos que aqui, em Deuteronômio 2.16-23, [1] Deus instrui e [2] intervém estrategicamente.

[1] Sim, Deus instrui e sim, nós precisamos da instrução de Deus. Instrução sobre salvação. Instrução sobre santificação. Instrução sobre ministério. Instrução para a vida, estratégica, diária e necessária para o enfrentamento de cada batalha.

Talvez você confunda o que eu estou dizendo, imaginando que eu esteja falando sobre profecias extrabíblicas, mas não é nada disso. O Espírito Santo os instrui pela Palavra de Deus lida, meditada, estudada, internalizada: “Guardo no coração as tuas palavras, para não pecar contra ti” (Sl 119.11).

Os santos da Bíblia e da História da Igreja, quando sobrecarregados com pesadas responsabilidades, devotavam mais tempo à meditação da Palavra com oração e jejum, pois precisavam aguardar, ouvir e discernir. Daí se levantavam cheios do Espírito Santo e lutavam como leões, pois quem ouve e segue a instrução de Deus está pronto para lutar as batalhas entre os homens.

Sendo assim, vamos ouvir a Deus mais e melhor. Ouvir dispostos a entender e atender. Eu fico pensando, por exemplo, em 1Coríntios 13.13: “Agora, pois, permanecem a fé, a esperança e o amor, porém o maior destes é o amor” (1Co 13.13). Será que estamos perdendo batalhas importantes, simplesmente por não praticarmos as instruções de Deus relativas ao amor?

[2] Sim, Deus intervém e sim, nós precisamos da intervenção de Deus. Deus operando em nós salvação, santificação e capacitação.

Se Deus não operar, temos de parar tudo. Dobrar a cerviz. Chorar e clamar até o fogo descer sobre a oferta no altar. Se Deus não intervir nosso esforço resultará em canseira e frustração. Se Deus não intervir nossos projetos não passarão de vaidade. Se dependermos de nós mesmos, de nossa pretensa sabedoria ou capacidade ou força, nós seremos envergonhados pelos inimigos.

Sabe isso que está travado, engessado, preso em sua vida? Deus precisa agir nisso. Quando Deus se manifestar; quando Deus interferir nisso — de fato e de verdade — a frutificação será diferente; o fluxo das coisas será diferente; o seu coração será diferente e os resultados serão diferentes.

[3] Ademais, os três verbos de batalha de Deuteronômio são importantes para nossa santificação. Pois para nos moldar segundo Jesus, Deus precisa destruir — literalmente matar, exterminar algumas coisas em nós. Como lemos em Romanos 8.13, nós precisamos de, “pelo Espírito”, mortificar “os feitos do corpo.”

E para nos aprontar para as batalhas da vida, nós precisamos desapossar, lançar fora, expulsar alguns inimigos que insistem em instalar-se em nosso coração, em nossa casa, em nosso trabalho e em nossa vida. Nós afirmamos e cantamos que tudo em nós e nosso pertencem exclusivamente a Jesus, mas ainda guardamos, escondemos, alimentamos algo que já deveria ter ido para o lixo. Eu oro para Deus conceda a você arrependimento e convicção hoje, para tirar da sua vida o que precisa ser desapossado!

E para desfrutarmos de alegria e descanso nos termos da Escritura, é preciso habitar na Terra Conquistada, em Deus, na Palavra de Deus, nas coisas de Deus. Neste âmbito do reino de Deus é que devemos investir tempo, energia e recursos. Plantar, cuidar e edificar.

[4] Agora sim, terminando tudo, Deus não instrui nem intervém sem propósito. As interações de Deus conosco são estratégicas, quer dizer, nos preparam para vida real que reserva para nós algumas batalhas. “Não desanimem”! — é o que Deus nos diz aqui em Deuteronômio. Continuem confiando. Eu sou o Deus fiel que reina sobre os inimigos”. Vamos agradecer a ele por isso.


Notas

[1] Estratégia é “a arte […] de planejar e executar movimentos e operações […] visando a alcançar ou manter posições relativas e potenciais bélicos favoráveis a futuras ações táticas sobre determinados objetivos”; cf. “Estratégia”. In: FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Dicionário Aurélio eletrônico 7.0. Curitiba: Editora Positivo, 2009. CD-ROM.

[2] O aspecto sombrio dos reféns tem a ver com o fato desta palavra ser usada em contextos ligados a ao alugar ou estado dos mortos; cf. HEISER, M. S. “Refaim”. In: BARRY, John D. (Org.). Dicionário bíblico Lexham. Bellingham, WA: Lexham Press, 2020. Logos software: “Vários textos bíblicos empregam rep̄ā·ʾîm em paralelo a outras palavras para os mortos sombrios (por exemplo mē·ṯîmʹ; “morto”) ou em contextos que lidam com a sepultura (qěʹ·ḇěr) ou o submundo (šeʾôl). O Salmo 88.10-11 pergunta: 10 Mostrarás tu prodígios aos mortos (mē·ṯîmʹ) ou os finados (rep̄ā·ʾîm) se levantarão para te louvar? 11 Será referida a tua bondade na sepultura (qěʹ·ḇěr)? A tua fidelidade, nos abismos (ʾǎḇǎd·dôn)? O hebraico mē·ṯîmʹ (“morto”) e rep̄ā·ʾîm também ocorrem em conexão um com o outro em Isaías 26.14 (“Mortos (mē·ṯîmʹ) não tornarão a viver, sombras (rep̄ā·ʾîm) não ressuscitam; por isso, os castigaste, e destruíste, e lhes fizeste perecer toda a memória. Provérbios 2.18 admoesta o homem sábio a evitar a sedução da adúltera, afirmando que “a sua casa se inclina para a morte [māʹ·wěṯ; “doença mortal”], e as suas veredas, para o reino das sombras da morte” (rep̄ā·ʾîm; cf. Pv 9.18). Jó 26.5–6 coloca os refains no submundo: “5 A alma dos mortos (rep̄ā·ʾîm) tremem debaixo das águas com seus habitantes. 6 O além (šeʾôl) está desnudo perante ele, e não há coberta para o abismo (ʾǎḇǎd·dôn).”

[3] BÍBLIA DE ESTUDO DE GENEBRA. 3ª ed. [BEG3]. São Paulo: Barueri: Cultura Cristã; Sociedade Bíblica do Brasil, 2023, nota 2.23 Caftor, p. 302.